sábado, 20 de setembro de 2008

Realidade subjetiva x Realidade objetiva - Parte 1

Normalmente, em discussões, me deparo com argumentos do tipo "A realidade é uma ilusão" ou "Você não pode provar que não sou apenas fruto da sua imaginação" ou ainda "Você não pode provar que você mesmo existe".Esse tipo de pensamento pertence àqueles que acreditam que a realidade é puramente subjetiva, inteiramente criada pela mente humana.Somos, então, uma grande ilusão, criada por nossas próprias mentes.Quem já viu Matrix sabe que 'se real é aquilo que você pode tocar, ouvir, cheirar, então real são impulsos elétricos enviados ao seu encéfalo, interpretados pelo próprio, gerando assim a realidade que em que você acredita'.Isso tem, de fato, um fundo de veracidade, mas esse argumento está longe de evidenciar que somos apenas ilusões, e que a realidade objetiva não existe.

Até mesmo o mais voraz defensor da subjetividade é obrigado a aceitar a existência de uma realidade objetiva.Peguemos o exemplo clássico, aquele em que tudo ao seu redor, o computador que está agora a sua frente, a cadeira em que está sentado, seus amigos, os carros que trafegam na rua, tudo é apenas um fruto da sua imaginação.Nada tem existência real, portanto, a realidade objetiva é totalmente subjetiva.Há uma falha fatal neste pensamento : o ser subjetivador, você, não pode estar unicamente dentro dessa realidade subjetiva.Em outros termos, você não pode unicamente ser fruto da sua própria imaginação, pois isso cria um paradoxo.Seria como você estar sonhando com você, mas você existe apenas dentro daquele sonho, e não fora dele.Como poderia então, estar sonhando algo?



O agente subjetivador, chamemos assim, tem, por necessidade, que estar da sua própria realidade subjetiva (ele pode ter uma projeção de si dentro dela, obviamente, mas a raiz da subjetivação tem de vir de fora).Estando fora da realidade subjetiva, temos duas situações possíveis : ou ele está imerso em outra realidade subjetiva, ou ele faz parte de uma realidade objetiva.Caso ele faça parte de uma outra realidade subjetiva, tem de haver outro agente subjetivador que está criando aquele realidade.Novamente, temos dois casos : ou esse agente faz parte de uma outra realidade subjetiva, ou de uma realidade objetiva.Como parece lógico, não pode haver uma estrutura infinita de agentes subjetivadores sem um agente final que esteja fora dessa cadeia de realidades, imerso em uma realidade estruturalmente objetiva, criando toda essa cadeia.



A partir do momento que temos a existência de uma realidade objetiva como fato, resta-nos perguntar como é essa realidade objetiva.Seria apenas um encéfalo coberto pelo mais absoluto nada, criando uma realidade subjetiva? Isso parece meio estranho.Essa explicação é fraca, e essa realidade objetiva necessita de uma estrutura, da mesma forma que a realidade subjetiva necessita de uma, para existir.
Em termos mais simples, como grande fã de Matrix, vou fazer uma analogia para que o entendimento fique mais fácil : imagine aquele mundo criado pela Matrix.Aquela seria nossa suposta realidade subjetiva.Enrolando um pouco com o enredo do filme, imagine que todas aquelas bilhões de pessoas eram apenas criações, apenas bits, da mesma forma que qualquer outra coisa nessa realidade."Viu, é exatamente assim nossa realidade, tudo uma ilusão, nada existe, sou apenas imaginação".Mas, peraí, de acordo com meu argumento, tem de haver um agente subjetivador, que seria aquele que recebe essas informações e cria esse mundo subjetivo em sua ferramenta de subjetivação.No caso do filme, esse agente seria Neo (com o roteiro um pouco embolado).Ele que receberia todas essas informações, e sua ferramenta subjetiva, seu encéfalo, criaria todo aquele mundo irreal, mas que pareceria real, objetivo, para ele.Veja como essa analogia se encaixa perfeitamente, pois, embora exista o mundo subjetivo, o objetivo também existe : o mundo das máquinas, que são as criadoras de Matrix, e as responsáveis por inserirem as informações na mente de Neo, para que ele pudesse criar essa realidade.Embora Neo tenha uma projeção de si em Matrix, ele também tem sua existência concreta na realidade objetiva.Esse mundo das máquinas poderia ser outra realidade subjetiva, criada pela mente de alguém, mas como argumentei, esse alguém que está subjetivando este mundo das máquinas, onde, por sua vez, Neo subjetiva Matrix, tem de ter uma existência concreta em uma realidade objetiva, ou entraremos num loop infinito, que não possui qualquer estrutura para o sustentar.

Chega de 'subjetivação' e 'objetiva' por hoje, numa outra oportunidade termino esse pensamento, argumentando o que acredito ser a verdadeira subjetivação e o que vem a ser a realidade objetiva (e como ela pode ser inferida via Ciência).

Link da imagem original : http://publicidade20071.files.wordpress.com/2007/08/pensador.jpg

3 comentários:

Thiago disse...

existe um filme, de 1999, que trata disso mesmo (sem a pirotecnia de matrix), chamado "o 13o andar". mas assim como seu irmão mais novo, falha em um ponto crucial: descobre a causa primeira de tudo.

admito, tal como você, a existência dessa realidade objetiva (não nego isso), contudo, daí a fazê-la congnoscível são outros quinhentos. ela é um postulado da razão, para que não caiamos numa cadeia sem fim. e postulados não se provam, se aceitam. é o recurso último, de uma unidade e simplicidade absoluta e, como tal, não pode ser decomposto em explicações. ele esta aí para explicar, e não para ser explicado. não invertamos os papéis. querer conhecê-lo, ter uma experiência dele, submetê-lo à prova é se desviar do caminho que te levou até ele.

exemplo clássico (havia, certa vez, pensado noutro melhor mas já me esqueci): o olho que tudo vê é incapaz de se ver a si mesmo. se o faz, é por meio do espelho, e isto quer dizer que se trata de um processo indireto, de natureza subjetivadora. o olho permanecerá intacto.

nosso cérebro, os instrumentos de medição científicos, o que quer que seja, já modifica e, por conseguinte, subjetiva a coisa observada. há certas religiões que prometem uma fusão com essa realidade última na vida extra-sensorial, mas até essas são coerentes em afirmar que não há conhecimento dessa realidade (porque já não há uma relação sujeito/objeto), e sim um desmanchar-se nela. continua, portanto, incognoscível.

se possível, visite kant. ele é o responsável pela "virada copernicana" do conhecimento. existem dois mundos: pós-kant e antes de kant. essa realidade última, ele a chamou de coisa-em-si. e a coisa-em-si não nos é revelada, apenas a coisa-para-nós. toda coisa-em-si deverá assumir uma manifestação para nós, e tudo o que conhecemos dela é essa manifestação, e não o seu em-si.

kant escreveu uma pilha interminável de livros. porém, suas três obras fundamentais são: "a crítica da razão pura", "a crítica da razão prática", e "a crítica do juízo". mas não recomendo assim de começo porque são barra pesada. no entanto, há um livro excelente chamado "compreender kant". ele tem a capa rosa, se não me engano, e o sobrenome do autor é pascal (nada a ver com o velho pascal de "o coração tem razões...").

gostei das imagens. só retrataria uma coisa: a realidade subjetiva também é "real". a não ser que você tenha a pretensão de viver na realidade objetiva única e exclusivamente, sem passagem de volta. caso não, é um pouco de preciosismo rotular isso onde vivemos de "irrealidade". (bom, os hindus o chamam de "véu de maya", o que, de fato, é uma espécie de ilusão. mas eles têm a pretensão de alcançar a realidade última, é esta a sua instância reguladora. mas acho que um cientista detestaria admitir que todos os seus experimentos não passam de ilusão...)

e, afinal, só para terminar com outro exemplo clássico, o cérebro não distingue impulsos elétricos gerados em estado de vigília daqueles gerados em estado de sono, distingue?

B.M.A. disse...

Primeiramente, o exemplo sobre o olho que tudo vê, o fato dele ter de se ver através do espelho não torna subjetivo o seu reflexo uma vez que a estrutura que é o espelho não permite que a luz o transponha ou se refrate, ele a reflete fielmente, e esse reflexo fiel, apesar de indireto, não deve ser tratado como subjetivo.

"nosso cérebro, os instrumentos de medição científicos, o que quer que seja, já modifica e, por conseguinte, subjetiva a coisa observada"

Bom, essa premissa é o que tornaria verídica e até incontestável o seu argumento (o de que a realidade objetiva nos é incognoscível), no entanto vê-se que ela é falsa.

Isso explica-se da mesma maneira que o contra argumento do olho que tudo vê. Veja bem, - descartando casos como anomalia ou disfunção de algum órgão do corpo humano - desde a transmissão de impulsos elétricos até a formação de qualquer pensamento lógico decorrente da informação recebida, não ocorre alteração. Por exemplo, o cérebro é capaz de "virar" imagens de ponta cabeça para facilitar seu entendimento (uma mulher cujo olho direito seja daltônico e o esquerdo normal vê normalmente com os dois olhos e não "metade de uma cor e metade de outra", isso porque o cérebro "colori" a imagem que vem do olho daltônico para que ela se adeque ao olho normal), no entanto, ele não o faz, ele o interpreta exatamente como ele é - poderíamos até dizer que ele é fiel à realidade.
E dizer que todos os instrumentos criados pelo homem não reproduzem a realidade objetiva de modo perfeito (a tornar objetiva essa reprodução) é petulância em excesso ou, no mínimo, má fé no homem.

VITOR HENRIQUE CONCIMO LANJONI disse...

Tenho uma pergunta. Não consegui entender o contexto do seu argumento: ''Peguemos o exemplo clássico, aquele em que tudo ao seu redor, o computador que está agora a sua frente, a cadeira em que está sentado, seus amigos, os carros que trafegam na rua, tudo é apenas um fruto da sua imaginação.Nada tem existência real, portanto, a realidade objetiva é totalmente subjetiva.Há uma falha fatal neste pensamento : o ser subjetivador, você, não pode estar unicamente dentro dessa realidade subjetiva.Em outros termos, você não pode unicamente ser fruto da sua própria imaginação, pois isso cria um paradoxo.Seria como você estar sonhando com você, mas você existe apenas dentro daquele sonho, e não fora dele.Como poderia então, estar sonhando algo? ''

Pode explicar-me?

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