sábado, 11 de outubro de 2008

Porque a fé não é racional?

O grande problema, considero eu, das crenças teísticas é um que a maioria compartilha : o proselitismo.Além deste, a dogmatização.Teístas, convencidos de serem donos da verdade absoluta, saem em militância afim de converter o máximo possível.Durante essa 'árdua missão', claro, não poderia faltar o preconceito para com aqueles que não fazem parte de suas ideologias.
Cristãos convencidos de que só quem louva Deus pode experimentar o amor, acreditam que ateus e demais teístas (que são, basicamente ateus, do ponto de vista cristão) são seres frios e desprovidos de afeição pelo próximo, já que é impossível algum sentimento nobre como amizade e respeito com o próximo germinar no coração de um ser onde há ausência de Deus (e, acredite, já fui acusado disso).

Mas não quero me aprofundar nessa questão, este foi apenas um parágrafo introdutório.Quero me ater em outro ponto, na falta de razão total das crenças.Como comecei a introduzir em um artigo anterior, à um deus são atribuídas diversas explicações para diversos fatos.Um cristão, por exemplo, que segue a bíblia, acredita ser Deus o criador do Universo, dos planetas nele presentes, da vida, além de diversos outros milagres que lhe são atribuídos.Note que não faz absolutamente qualquer sentido atribuir a Deus tais feitos, e demonstro porquê.

É importante salientar que os cristãos acreditam ser Deus intocável pela ciência, ou seja, não podemos, de forma alguma, provar que determinado fato é proveniente de uma causa divina, pois não podemos ter acesso a essa causa.Se X fosse um fato qualquer, não poderíamos afirmar que ele deriva de D, uma causa divina, pois D não poderia ser detectada pela nossa ciência.Por isso acredita-se que os milagres são fatos que não possuem qualquer explicação racional, ou natural, já que, sendo derivado diretamente de uma causa divina, este fato pareceria, para nós, como advindo do nada, de lugar algum.
Peguemos, novamente, o fato X.O fato X pode ser simplesmente qualquer coisa, para exemplificar, vamos adotar que X seja a emergência da vida na Terra.Constatado que a vida existe na Terra, temos que X é um fato válido.Aplicando a causalidade, podemos inferir que X deriva de um outro fato, chamemos Z, que causou a vida na Terra (obviamente não foi um fato isolado o responsável, mas vamos simplificar).Z permanece desconhecido para nós, embora saibamos que ele tem de existir, pois todo a todo efeito está atrelado uma causa (não quero entrar também nos méritos de discussões sobre causalidade.Vamos partir da premissa que ela é válida).Portanto, temos X e temos o conhecimento de que Z existe, e provocou X.Qual é a posição sensata, ante a ignorância em relação a Z? Eu diria, por acreditar que esta é a posição sensata, que devemos invocar hipóteses para podermos tentar desvendar Z.Munido de possíveis explicações, utilizando conhecimentos anteriores, devemos pesquisar Z para podermos definí-la completamente.Enquanto estudo Z, não sei o que ela é, não adoto uma explicação como verdadeira até ter provado, e mesmo após ter provado, minha explicação permanece questionável para qualquer um que discorde da minha definição.Durante todo esse processo, eu permaneço totalmente neutro em relação a Z, afinal, não sei do que se trata.
Agora, o que faz um teísta em relação a um fato X qualquer, cuja causa desconhece? Simples, ele assume que foi um deus e pronto.Muito simples, poupa bastante trabalho, não é preciso formular hipóteses, estudar, gastar tempo pesquisando.Ele apenas assume que foi uma causa divina, confecciona uma estátua deste ser divino que provocou X e reza pra ela.Onde está a razão nisso? Onde está o sentido nisso? Onde está a sensatez nisso?

Diante de um mistério, por mais complexo que seja, a posição sensata é sempre pesquisar.Não importa quanto tempo leve, nem quanto esforço irá custar.Muitos acreditam que existe um prazo de validade para um mistério.Se eu pesquiso por 50 anos e não descobri a causa, então automaticamente passa a ser efeito divino.Se eu desconheço a explicação de um mistério, os teístas riem de mim e se vangloriam de saber a resposta : Deus.Como já postei antes, durante um debate com um teísta, ele afirmou que minha resposta 'Não sei' para a sua pergunta 'Como o Universo surgiu' é demonstração de 'preguiça intelectual'.Sou obrigado a conhecer a explicação de todos os mistérios do mundo, senão sou simplesmente um preguiçoso.É claro que ele sabia a resposta pra essa pergunta, 'Foi Deus', ora essa, como não haveria de ser?

Apesar do que alguns afirmam, a maioria não assume deus como uma HIPÓTESE, o que, para mim, é algo totalmente plausível.Assumir deus como uma hipótese que pode explicar a causa de um fato é se manter neutro a essa causa, e estar estudando-a com a finalidade de descobrí-la.Porém, quando eu não faço sexo porque está escrito na bíblia que Deus é contra sexo fora do casamento, eu não estou assumindo Deus como uma hipótese, estou tomando como premissa que ele existe, já que a bíblia supostamente é sua palavra, e se eu a sigo, e porque acredito na validade dela, logo, acredito que Deus existe.

Qualquer tipo de fé é sem sentido, pois a premissa básica é acreditar em algo que não pode ser provado e que nunca poderá ser provado.Adotar isto como uma explicação para a causa de um fato é absolutamente ridículo.Adotar uma divindade como hipótese, é perfeitamente compreensível.Eu mesmo não ouso descartar uma explicação divina para a emergência do Universo, pois não é científico inferir a inexistência de algo.Apenas me reservo ao direito de considerá-la a menos implausível dentre outras explicações.

Em síntese, diante de um fato, afirmar que sua causa é divina por desconhecermos sua causa não é sensato.Primeiro porque não podemos provar que a causa é divina, então não vai passar de pura fé.Segundo, porque, como dizia Carl Sagan, 'Ausência de evidência não é evidência de ausência', ou seja, não é porque ainda desconhecemos a causa de um fato, que ela não existe.Como os teístas assumem como premissa básica que uma causa divina não pode ser detectada, então os fatos que não possuem causas naturais, são automaticamente adotados como milagres.O problema está em adotarem prematuramente que um fato não possue causas naturais.Como eu posso afirmar que um fato não tem causas naturais? Se teletransportasse para o passado uma televisão, os pobres humanos não iriam fazer idéia de como explicar aquilo naturalmente.Isso significa então que a televisão foi obra divina? Não existe um meio de afirmar que algo não possue causas naturais, pois não temos conhecimento de todos os mecanismos do Universo.Se soubéssemos TUDO a respeito do Universo, e pudéssemos provar que o que sabemos é REALMENTE TUDO, aí sim poderíamos adotar algo como um milagre se não soubéssemos explicar, já que, aí sim, este fato não possuiria causas naturais.Mas sabemos quase nada sobre o Universo, então onde está a sensatez em antecipadamente decidir que algo não tem uma causa natural?

A fé é, portanto, algo ilógico e irracional.Se alguém quer ser ilógico e irracional, que seja apenas dentro da sua cabeça.Mas querer enfiar sua falta de lógica e sua irracionalidade goela adentro dos outros é algo digno de pena.Pior ainda é dogmatizar crianças, cujo senso crítico ainda não está formado, com falta de lógica de irracionalidade.Que tal deixar a decisão de ser ilógico ou irracional para quando esta criança tiver idade suficiente para decidir o que quer da vida? Se crianças acreditam em Papai Noel, é óbvio que irão acreditar em qualquer baboseira que os adultos lhe ensinarem.E assim segue o ciclo memético da fé.

Um comentário:

Thiago disse...

Ihr kalten Heuchler, sprecht von den Göttern nicht!
Ihr habt Verstand! ihr glaubt nicht an Helios,
Noch an den Donnerer und Meergott;
Tot ist die Erde, wer mag ihr danken? --

Getrost, ihr Götter! zieret ihr doch das Lied,
Wenn schon aus euren Namen die Seele schwand,
Und ist ein Großes Wort vonötten,
Mutter Natur! so gedenkt man deiner.

Dos deuses, ó frios fariseus, não me faleis:
Pois de razão viveis, e em Hélios não acreditais,
E nem mesmo no Tonante, e nem no deus do mar!
Jaz a terra morta, e quem lhe deve agradecer?

Paciência, deuses, que o cantar ainda laureais,
Mesmo em fuga esteja a alma aos nomes vossos!
E quando falte um verbo de grandeza,
Que em ti se pense então, Mãe Natureza.

F. Hölderlin

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