sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Liberdade e Ateísmo

É certo que o ateísmo confere certa liberdade aos que adotam sua filosofia.O ateu não mais se vê diante dos olhos incansáveis de um ente supremo que o seguem até nos momentos de maior intimidade, não mais necessita se sentir culpado ao 'cometer' atos de extrema insignificância, que muitos julgam serem pecados mortais, não mais precisa deixar de gostar de determinadas coisas porque uma deidade em específico desaprova-a, não mais precisa seguir mandamentos que muitas vezes não entende, e até discorda, embora acredite que deva manter essa discordância muda, seguindo cegamente tais ensinamentos, muitas vezes por medo, outras por ambição pelo tão sonhado prêmio eterno.Em resumo, o ateu pode tirar o encéfalo da inércia e começar a usá-lo para julgar, concordar, discordar, opinar.

Não que teístas não possam fazer tais coisas.Obviamente podem, e o fazem.Mas, convenhamos, as restrições são bem maiores.Só por acharem que duvidar da existência de sua divindade já é uma heresia, podemos perceber.Estando mais abertos a novas opiniões, a novos modos de pensar, o ateu (ou pelo menos aquele que duvida, mesmo mantendo a crença, embora seja um paradoxo) acaba apreciando um grau de liberdade mais notável do que o dogmatizado.

É claro que o ateu não é o ser mais livre desse mundo.Claro que não experimentamos a liberdade plena, enquanto os teístas ficam encarcerados dentro de suas convicções inatingíveis por dúvidas.Até porque liberdade plena é algo teórico, e não prático.
O que acontece é que o ateu tem um poder maior de julgamento, que rompe os simplórios limites dos ensinamentos de um livro milenar.O ateu experimenta o poder de entender aquilo que necessita ser estudado, e não simplesmente aceita porque um ser mágico disse que é assim que tem que ser.
Justamente por essa capacidade, somos maus vistos, pois julgam-nos como devassos, puramente hedonistas, sem quaisquer valores, sem moral, pois estes que julgam, acham que valores e moral podem apenas ser extraídos de seu livro sagrado.Acreditam que a moral absoluta está escrita nas páginas de um livro velho, e todos aqueles que não compactuam com esse livro, não seguem essa moral absoluta, logo, são sodomistas.Estes acham que não há motivos, por exemplo, para um ateu ser solidário com um próximo, pois: 1) ele não teme um deus e 2) ele não acredita no céu.Se ele não teme um deus, então não tem porque ele ser solidário, já que Deus nos manda ser solidários, e quem não for, sofrerá as consequências.Se ele não acredita no céu, então não tem porque ele ser solidário, já que Deus diz que apenas os solidários vão para o céu.Logo, nada impede o ateu de chutar o próximo, em vez de dar-lhe roupas de frio ou alimento.
Uma frase muito interessante, que infelizmente não lembro a quem pertence, diz que 'Se agimos bem por medo ou esperando uma recompensa, então somos uma espécie bem medíocre'.Uma pessoa que alimenta tais pensamentos em relação a um ateu com certeza acredita que só existem estes dois motivos para se agir bem, por medo ou por ambição.Se ela acredita que existem apenas estes dois motivos, então podemos concluir que ela age por pelo menos um desses motivos.Ou ela é solidário porque teme o inferno, ou almeja o céu.Que moral é essa? Que valores são esses? Ajudar o próximo apenas porque isso vai lhe garantir uma passagem para o céu? Isso é ser bom?
Se Deus existir, e for justo, então com certeza vai preferir o altruísmo de um ateu, que o faz sem esperar nada em troca, tanto fisica quanto transcendentalmente, a um ato altruísta forçado de um crente, que o faz porque isso vai lhe garantir o céu.Se Deus preferir este último, então não é um ser justo, e acho que vou estar bem melhor no inferno, bem longe dele.

Ateus não são destruidores, assassinos ou pessoas sem compaixão só porque não acreditam que uma boa ação lhe renderá frutos no pós-vida.E também, como os teístas, estamos sujeitos a regras.Todos vivemos em sociedade, e para que ela funcione bem, são necessárias leis.Todos devem estar sujeitos a estas leis.Existem dois tipos de leis, as implícitas e as explícitas.Leis explícitas são aquelas que são traduzidas pro papel.Matar, por exemplo, na nossa sociedade, é um crime, e a pessoa que cometeu tal crime irá pagar com o encarceramento e consequentemente, com o afastamento da sociedade (pelo menos em tese).Mas não matar também pode ser considerada uma regra implícita em uma outra sociedade.A dos babuínos, por exemplo.Um conselho de babuínos não decidiu que matar é algo errado e que os babuínos não devem praticar tal ato, mas mesmo assim babuínos não saem por aí matando seus semelhantes.E a explicação é simples : se fizessem isso, não teria como existir uma sociedade de babuínos, pois eles não poderiam andar juntos, ou brigariam até a morte de um.Sozinhos, são muito mais vulneráveis do que unidos.Essa é uma regra implícita, que existe devido a estrutura da sociedade.Para que haja uma sociedade por mais simples que seja, um conjunto de leis implícitas se faz necessário, entre eles, não matar seus semelhantes.
Portanto, todos, ateus ou não, estamos sujeitos a estas regras.Caso descumpramos uma ou mais, devemos pagar as penalidades que democraticamente são escolhidas (pelo menos em tese).E assim a sociedade vai caminhando, de maneira pacífica.

Imagine um cenário onde todos vivem felizes, com um teto em cima de suas cabeças, com a barriga cheia.Todos vivem pacificamente, amigavelmente, todos curtindo suas vidas da melhor maneira possível.É um cenário utópico? Pelo menos eu acredito que sim.A pergunta é: dogmas religiosos se fazem necessário para que tal cenário se cumpra? Pelo menos eu acredito, veementemente, que não.O que é preciso para que cheguemos o mais perto possível desse cenário? Educação + Leis + Líderes honestos.Tudo começa com uma boa educação.Eu não tive educação religiosas, no entanto, não sinto uma necessidade incontrolável de beber sangue humano, vontade que alguns acreditam que os ateus partilham, simplesmente por serem ateus.Uma boa educação para as crianças, um conjunto bom de leis para que a sociedade funcione e líderes honestos para fazê-las serem cumpridas, e teremos um bom lugar para se viver.Não existe necessidade de religiões.

Um amigo meu acredita que a religião é boa para manter as pessoas mais pobres nos eixos.É uma maneira interessante de pensar, e, por outro lado, muito prosaica.O que é melhor: que mantenhamos as pessoas mais simples em grilhões de crenças sem sentido, ou que façamos investimentos para educar estas pessoas simples, tornando-as mais críticas, e, consequentemente, chegando mais perto do nosso cenário utópico? Sem contar que religião não previne nada, e os apenas 1% do total da população carcerária dos EUA serem ateus, confirma isso.Mais de 95% do nosso país se declarando como pertencente a alguma religião, mas sendo, pelo menos o meu estado, um dos mais violentos do mundo, confirma mais ainda.

Deixo então uma conclusão, e uma idéia: ateus não são seres malignos loucos por almas humanas, pelo contrário, o ato altruísta de um ateu é muito mais belo do que o de um teísta, que pode esconder segundas intenções por trás, e derrubemos igrejas e construamos mais escolas.

2 comentários:

Thiago disse...

muito bonito esta sua defesa do ateísmo (ou será mais um libelo?). muito apaixonado. muito sincero.

contudo, em vez de destruirmos igrejas proponho que convidem o papa para benzer pessoalmente o acelerador de partículas. seria muito mais interessante...

Thiago disse...

cadê o resto, diego?

seja como for, ainda acho que o seus maiores equívocos (a despeito dos seus inúmeros méritos argumentativos) são: (i) atacar em lugar de dialogar, isto é, adotar não somente uma postura crítica (o que é ou seria o ideal de qualquer interação), mas sobretudo "viciada", autoritária, xenófoba; (ii) deter-se nos ataques à religião. por que, por exemplo, não manter um "diálogo" também com a filosofia, com as artes, com a política?; (iii) atacar a ala mais debilitada da religião, a menos interessante intelectualmente e a mais propensa a não resistir a qualquer incursão mais sistemática ou rigorosa, a saber, a fé que, apropriada pela multidão, pelo povão, acaba se tornando superstição e desvario.

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